Você sabia que um ser humano toma, em média, 35 mil decisões por dia? Isso mesmo! Em outras palavras, isso significa que tomamos uma decisão a cada 2 segundos.
E agora, entre essas decisões, quantas será que tomamos usando tecnologia?
A todo momento somos influenciados pelo mundo digital ao qual somos expostos, fazendo com que criemos alguns hábitos sem nem nos darmos conta do impacto que isso gera diariamente nas nossas vidas, sejam eles bons ou ruins.
Intrigado com a forma que os produtos digitais nos influenciam diariamente, Nir Eyal começou a estudar mais sobre o assunto para entender qual a fórmula usada pelos produtos formadores de hábitos que fisgam os usuários. Nesse processo, ele chegou a um ciclo de 4 etapas, chamado Modelo Hooked ou Modelo Gancho.
Como o objetivo principal desse modelo é ajudar a criar produtos que criem um hábito na vida dos consumidores, ele não é uma ferramenta que deve ser usada para desenvolvimento de qualquer produto. Isso porque o design de hábitos, se voltado para o bem, pode criar hábitos que melhoram a vida das pessoas de forma saudável. Por outro lado, se usado para exploração ou qualquer outra intenção negativa, os hábitos podem se transformar em vícios que afetam a saúde física e mental das pessoas.
As etapas do Modelo Gancho
As 4 etapas por trás desse conceito são: gatilho (que pode ser interno e externo), ação, recompensa variável e investimento.
Gatilho
O gatilho aciona o comportamento. Produtos formadores de hábitos começam alertando os usuários com gatilhos externos, como e-mails, links de sites, push notification no smartphone, entre outros. E então o gatilho interno passa a ser acionado quando atrelamos emoções ao que faremos em seguida.
Gatilhos externos são incorporados às informações, que dizem ao usuário o que fazer em seguida.
Um gatilho externo comunica a próxima ação que o usuário deve realizar, e alguns desses gatilhos podem ser:
- Pagos: publicidade, marketing em mecanismos de busca e outros canais pagos são usados para chamar a atenção do usuário e levá-los a agir;
- Ganhos: eles são gratuitos pois não podem ser comprados diretamente, mas vão exigir investimentos no tempo gasto em relações públicas e mídia, como vídeos virais que podem chamar a atenção. Para que os ganhos impulsionem a aquisição contínua de usuários, as empresas devem manter seus produtos sob os holofotes;
- Relacionamento: uma pessoa comentando com outras sobre um produto ou serviço pode ser um gatilho externo eficaz para ação, e isso pode se dar por meio de curtidas no Facebook e Instagram, propaganda boca a boca ou referências a produtos, por exemplo;
- Próprios: aqui cabe ao usuário optar por permitir que esses gatilhos apareçam, como no caso de ícones de aplicativo no celular, newsletter via e-mail por assinatura e outras coisas que só vão aparecer se o usuário permitir.
Quando um produto se vincula a um pensamento, uma emoção ou rotina, ela usa o gatilho interno.
Gatilhos internos se manifestam automaticamente em sua mente. Conectar gatilhos internos a um produto é a oportunidade de ouro da tecnologia formadora de hábitos.
Emoções negativas são gatilhos internos poderosos e influenciam muito nossas rotinas diárias. Sentimentos de tédio, solidão, frustração, confusão, indecisão e irritação, por exemplo, estimulam uma ação quase imediata para reprimir a sensação negativa.
Emoções positivas também podem servir como gatilhos internos, e podem até trazer uma necessidade de satisfazer algo que está incomodando, afinal usamos produtos para solucionar nossos problemas.
Ação
Depois do gatilho vem a ação, o comportamento feito em antecipação a uma recompensa.
As empresas alavancam duas engrenagens básicas do comportamento humano para aumentar a probabilidade de uma ação ocorrer: a facilidade de realizar uma ação e a motivação psicológica para fazê-lo.
Enquanto o gatilho estimula as ações, a motivação define o nível de desejo de realizar essa ação.
Uma das indústrias que mais torna os elementos da motivação explícitos é a publicidade, influenciando o hábito das pessoas através de anúncios.
Um exemplo de publicidade que pode mexer com emoções negativas como o medo é a mensagem em cigarros, como no exemplo a seguir:
Outro exemplo de publicidade, só que agora mexendo com emoções positivas, são as propagandas de amigos bebendo cerveja em um bar. Veja o exemplo a seguir:
Outro fator importante para fazer com que os usuários tomem uma ação, além da motivação, é a habilidade.
Consequentemente, qualquer tecnologia ou produto que reduza de modo significativo os passos para concluir uma tarefa terá altas taxas de adoção pelas pessoas que ele auxilia.
Qualquer produto desenvolvido que não exija esforço mental, não tenha complexidade de uso e que ainda proporcione soluções para as principais dores de quem usa, aumenta drasticamente a probabilidade de usuários passarem a utilizá-lo frequentemente.
Recompensa variável
Recompensas variáveis são uma das ferramentas mais poderosas que as empresas implementam para fisgar usuários. Algumas pesquisas mostram que os níveis de dopamina aumentam quando o cérebro espera uma recompensa.
Os produtos e serviços mais formadores de hábitos utilizam 1 ou mais dos 3 tipos de recompensa variável: a tribo, a caça e o ego.
A tribo trás recompensas sociais alimentadas pela conexão com outras pessoas como likes, comentários e número de visualizações.
A caça é a busca por recursos, como informação, descontos, acordos, entre outros.
Já o ego está atrelado a uma conquista pessoal e intrínseca de controle, realização e recompensa, como o que acontece ao terminar um livro, ganhar em um jogo ou completar uma to-do list.
Recompensas variáveis devem atender às necessidades dos usuários, ao mesmo tempo em que permitem que eles queiram se envolver com os produtos.
Investimento
Essa última fase do Modelo Gancho é a que garante que o usuário vai passar novamente por todo esse ciclo no futuro.
O investimento ocorre quando o usuário agrega algo ao produto ou serviço, como tempo, dados, esforço, capital social ou dinheiro.
Esse investimento implica uma ação que melhora o serviço para a próxima rodada. Convidar amigos, mostrar preferências, construir coleções virtuais e aprender a usar novos recursos, por exemplo, são tipos de investimento que as pessoas fazem para melhorar suas experiências.
Esse tipo de engajamento pode tornar o gatilho mais envolvente, a ação mais fácil e a recompensa mais emocionante a cada passagem pelo ciclo do Modelo Gancho.
Na fase de investimento, pedir que seus usuários trabalhem um pouco vem depois de receberem algumas recompensas variáveis, não antes.
O momento de solicitar investimento é extremamente importante. Quando isso é feito após a recompensa, a empresa tem a oportunidade de alavancar uma característica central do comportamento humano.
A grande ideia por trás dessa fase é tirar proveito do entendimento das pessoas de que o produto será melhor com o uso frequente (e investimento pessoal).
Resumindo: engajamento a longo prazo
Em resumo, o Modelo Gancho foi projetado para conectar o problema do usuário à solução do designer, com uma frequência suficiente para formar um hábito. É uma estrutura para criar produtos que resolvem as necessidades por meio de engajamento a longo prazo.
Conforme usuários passam pelos ciclos desse modelo, esses clientes aprendem a atender às suas necessidades com o produto em questão.
Os ganchos mais eficazes realizam transições necessárias, fazendo com que as pessoas que confiam em gatilhos externos passarem a criar associações mentais com gatilhos internos. Consequentemente, elas passam então de estados de baixo envolvimento para alto envolvimento, e de baixa preferência para alta preferência.
Em um mundo onde somos bombardeados o tempo todo por novas tecnologias, fazer com que esses produtos se tornem essenciais e virem hábitos é um grande desafio. Porém, é importante ressaltar que isso também demanda muita responsabilidade, pois esses produtos podem estar conectados com as partes mais importantes da vida das pessoas. Ou seja, isso nos leva a refletir e analisar muito bem que tipo de vício queremos inserir no dia a dia de alguém.
Para saber mais detalhes sobre o Modelo Gancho, recomendo que leia o livro “Hooked“, do Nir Eyal, que foi a base para escrever esse artigo.
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