O Design Thinking não é visto como um processo e sim uma abordagem, pois em cada cocriação podem haver variações nas ferramentas aplicadas. Existem etapas a serem seguidas, para dar uma visão 360° do problema a ser resolvido, mas o facilitador escolhe quais serão as ferramentas utilizadas em cada etapa.
O Design Thinking é a união da criatividade no nível individual e a inovação no nível colaborativo. Os participantes aprendem primeiro para depois construir, realizando um movimento inovador centrado no ser humano, trazendo a solução para um problema complexo ou desentendido. A palavra inovação não está ligada à complexidade, uma vez que existem soluções simples que resolvem o problema do usuário.
De acordo com BRENNER e UEBERNICKEL (2016), Design Thinking é definido como: mentalidade, processo e caixa de ferramentas.
Modelos do Design Thinking e suas respectivas etapas
Antes de explicar como o Design Thinking contribuiu para a performance de um time de Vendas no setor imobiliário, vale contextualizar também que existem modelos para serem seguidos nessa abordagem. Aqui separei os 3 mais conhecidos:
- O modelo da IDEO tem 3 etapas: inspiração, ideação e implementação;
- O modelo Double Diamond da Design Council UK tem 7 etapas: entendimento, observação, ponto de vista, ideação, prototipagem, testes e iteração;
- O modelo da Universidade de Stanford tem 5 etapas: empatia, definição, ideação, prototipação e teste.
Não existe o modelo certo ou errado. É importante testar e entender o que faz sentido para o problema analisado.
Nesse estudo de caso utilizamos o modelo 3, ou seja, o modelo da Universidade de Stanford, principalmente por ser um modelo muito utilizado em cursos. Então esse artigo vai se aprofundar nesse modelo.
E para se aprofundar no tema Design Thinking – desde o surgimento e explicação da abordagem até indicações de cursos – recomendo este artigo.
Aplicação do Design Thinking no mercado imobiliário durante a pandemia
Em maio de 2019, uma equipe da Lopes (empresa do setor imobiliário) enfrentou problemas para vender imóveis em tempos de Covid-19. Como sabemos, esse foi um dos segmentos que mais sofreu durante a pandemia.
Então a equipe reuniu-se para aplicar o Design Thinking, pensando em encontrar nessa abordagem uma solução para melhorar a motivação dos vendedores na oferta imóveis, assim como a performance das vendas. Como já mencionei antes, o modelo utilizado foi o da Universidade de Stanford, com 5 etapas.
O duplo diamante representa o momento de criar alternativas (divergir) e fazer escolhas (convergir). O processo converge na etapa 2, diverge na etapa 3 e converge novamente na etapa 4.
A seguir vamos entender como foi o passo a passo de aplicação do estudo de caso, apresentando algumas das ferramentas que auxiliam na abordagem e que foram utilizadas nesse contexto. Porém vale ressaltar que há uma infinidade de ferramentas para cada etapa, sendo de responsabilidade do facilitador do processo definir qual ferramenta é mais apropriada para o movimento inovador.
1. Empatia
O significado da palavra empatia, é sentir a dor da outra pessoa em determinado contexto. É muito além do que calçar o sapato do próximo, porque o sapato pode não ser do mesmo número que o seu. Sendo assim, é quando existe uma afinidade grande que se consegue compreender a dor da outra pessoa, a ponto de não fazer julgamentos.
O Design Thinking começa com um problema a ser estudado. A etapa de empatia tem o objetivo de entender esse problema, recebendo informações até ter o mesmo sentimento do “dono” do problema que será resolvido.
Para criar empatia é possível realizar entrevistas, investigar a fundo informações ou ir até o local do problema para vivenciar a “dor”. Algumas ferramentas que podem ser utilizadas nessa etapa são:
- Teste dos 5 Porquês;
- Mapa da Empatia;
- Observação no local.
Nessa etapa do estudo de caso foram utilizadas as ferramentas 5 Porquês e Mapa da Empatia.
5 Porquês
Nesse framework, os participantes definem o problema e fazem 5 perguntas iniciadas com “por que”. Ou seja, é preciso responder 5 vezes o porquê existe esse problema, assim os participantes vão chegar até a causa raiz. Sendo assim, o teste ajuda na investigação do problema que está sendo estudado.
No nosso estudo de caso, a ferramenta dos 5 Porquês foi aplicada sob 2 óticas. A primeira na visão cliente e a segunda na visão consultor de imóveis.
Na visão do cliente, o problema inicial foi a dificuldade de converter as tratativas de Vendas:
- Por que temos dificuldade na conversão de vendas? Porque explicamos o projeto para o cliente e na hora de agendar a visita o cliente some;
- Por que o cliente some? Porque ele não se sente seguro para ir até o plantão de vendas;
- Por que o cliente não se sente seguro? Porque o momento de pandemia é incerto e muitas surpresas podem acontecer;
- Por que o momento da pandemia é incerto? Porque muitas pessoas estão sendo contaminadas, e alguns setores estão sendo atingidos;
- Por que muitas pessoas estão sendo contaminadas e muitos setores estão sendo atingidos? Porque estamos vivendo um momento pandêmico que infelizmente está atingindo empresas e famílias.
Na visão do consultor de imóveis, foi discutida a importância de converter as tratativas em vendas.
Por que queremos converter as tratativas em vendas? Porque trabalhamos com vendas, é a nossa profissão;
- Por que é a profissão de vocês? Porque nos identificamos e gostamos dela;
- Por que se identificaram e gostaram dessa profissão? Porque “dorme pobre e acorda rico”;
- Por que “dorme pobre e acorda rico”? Porque vendemos imóveis de valores variados;
- Por que vendem imóveis de valores variados? Porque abrangemos todas as classes.
A partir das respostas, podemos ver que na ótica do cliente o momento pandêmico era algo que impactava muito, pois o cliente sentia insegurança ao aplicar o seu dinheiro com tantas incertezas vivenciadas.
Mas, do outro lado, na visão do consultor de imóveis, não existia algo mais importante do que vender. Essa ferramenta ajudou a enfatizar que mesmo em tempos de COVID-19, o consultor de imóveis gosta da profissão e precisa se adaptar para cumprir com seus compromissos financeiros.
Mapa da Empatia
O Mapa da Empatia é um quadro dividido em 6 partes que ajuda a entender o cliente investigado. Para cada etapa há uma pergunta na qual os participantes colocam a sua percepção dos sentimentos do cliente, pessoa ou usuário que está tendo o problema.
No estudo de caso sobre Design Thinking no setor imobiliário, todos os participantes colocaram os post-its no mapa, pensando na ótica do cliente.
Com quem quero ter empatia?
- Casal, jovem, sem filhos que quer sair do apartamento de 45m² para um maior;
- Mulher, solteira, meia-idade;
- Casal com 2 filhos.
O que essa pessoa precisa fazer?
- Assinar o contrato para comprar o imóvel;
- Ir conhecer o imóvel.
O que vê?
- Oportunidade;
- Enxerga que pode melhorar a proposta;
- Pandemia.
O que diz?
- “Não pretendo sair de casa”;
- “Quero aguardar um pouco”;
- “Pode me mandar o material?”
O que faz?
- O cliente aguarda as condições da pandemia.
O que escuta?
- O cliente escuta a proposta do corretor de imóveis.
O que sente e pensa?
- Suas dores;
- Na diminuição do salário;
- Em perder o emprego.
Ganhos
- Comprar o apartamento dos sonhos com uma boa negociação.
Outros pensamentos ou sentimentos que motivam o seu comportamento?
- Contaminação pela Covid-19.
2. Definição
Nessa etapa, depois de receber muitas informações sobre o problema e adquirir contexto sobre o que foi abordado, é o momento de tomar a decisão e definir qual é a causa do problema que será solucionado.
Alguns exemplos de ferramentas são: quadro de ponto de vista, frase de ponto de vista, personas e Matriz CSD.
Nesse case, as utilizadas foram a frase de ponto de vista e a Matriz CSD.
Frase de ponto de vista
A frase do ponto de vista é uma ferramenta bem objetiva, que cria a seguinte narrativa:
Como podemos (ação) para (quais pessoas) para que (com qual resultado)?
Nessa aplicação do Design Thinking no setor imobiliário, a frase ficou:
Como podemos converter em vendas as nossas ofertas para que os clientes de diferentes níveis sociais comprem os imóveis da Lopes?
Matriz CSD
A Matriz CSD representa as certezas, suposições e as dúvidas do problema que está sendo discutido (saiba mais sobre o framework aqui). Em um Discovery com Design Thinking, quanto maior o número de certezas mais maduro está o processo de descoberta para seguir para a etapa de ideação. Se os participantes possuem muitas suposições e dúvidas, é importante validar as informações, fazer pesquisas, entender de fato o que se passa, buscando fazer com que o número de certezas seja sempre maior.
Na Matriz CSD, os participantes colocaram 4 post-its em “certezas” e 1 em “suposições”:.
Certezas:
- Os clientes estão com medo de fazer um investimento imobiliário;
- Mesmo com tudo incerto, é possível;
- Tudo irá passar;
- O corretor precisa se animar para vender.
Suposição:
- Se desenvolvermos coisas internas, vamos vender.
3. Ideação
Após ter a definição do problema, é o momento de fazer o levantamento de ideias. Não existe ideia certa ou errada, tudo é válido nessa fase do processo.
Ferramentas que podem ser utilizadas nessa etapa são: brainstorming, fluxograma e storytelling.
Aqui utilizamos o brainstorming dividido em 3 etapas. Para cada etapa os participantes tiveram 5 minutos para colocar as ideias. O resultado foi o seguinte:
1 etapa:
- Montar um site na plataforma Google sites para compartilhar com o cliente as informações dos projetos;
- Fazer anúncios em redes sociais;
- Trabalhar a motivação e se esforçar. Acreditando em Deus, teremos lindos resultados;
- Pedir para amigos e parentes compartilharem os anúncios;
- Aumentar a flexibilidade com relação a valores e descontos;
- Passar para o cliente as medidas de segurança que a empresa imobiliária tomou na quarentena. Para aumentar a segurança de conhecer o projeto.
2 etapa:
- Mudar o script para atingir mais clientes;
- Continuar fazendo a oferta ativa;
- Dar kit segurança para o cliente (álcool e máscara);
- Atendimento com segurança (em termos de contaminação) e hora marcada;
- Exercitar a mente;
- Criar cronograma diário: fazer 50 ofertas ativas, posts criativos nas redes sociais e o mais importante: um motivar o outro, não desanimando por conta de clientes curtos e grossos;
- Ao entrar em contato com o cliente, não falar com voz de tristeza.
3 etapa:
- Vender é energia, sempre que começar uma oferta ativa, passar essa energia boa ao cliente;
- Ao acordarem, lembrarem das coisas boas que já aconteceram na vida. Assim vão iniciar o dia com positividade;
- Abordar o cliente com uma energia boa;
- Buscar clientes até encontrar pessoas interessadas independente de pandemia;
- Entender a necessidade do cliente;
- Passar segurança para o cliente.
Vale reforçar aqui que durante a ideação todos precisam contribuir, livres de julgamentos.
4. Prototipação e teste
Após coletar todas as ideias é o momento de definir e refinar as ideias que serão levadas para a construção do protótipo. O protótipo pode ser de baixa fidelidade, o único requisito é conseguir a validação com ele.
Nessa etapa pode ser construído um wireframe, construção de maquete, utilização de legos, figma, etc.
Após prototipar, a próxima etapa é realizar testes com os usuários. Esse é o momento de validar a solução e aprender com ela. A validação ocorre com o usuário/cliente, ou seja, o stakeholder que é o dono do problema inicial.
Os participantes ficam atentos às expressões do cliente no momento da apresentação da solução, e se existir ajustes a serem feitos, é preciso fazer posteriormente uma nova apresentação com todos os ajustes.
No case da Lopes não foram realizadas essas 2 etapas com os participantes. Mas ficou de “lição de casa”, pegarem todas as ideias e colocarem em prática. Daí surgiram ideias que foram desde a mudança de mindset até algumas mais comportamentais. Além disso, foram sugeridas melhorias no tom de voz, mais persistência na hora de falar com os prospects e adaptações no script de vendas para passar segurança ao cliente.
Resultados obtidos
A equipe estava de janeiro a maio sem realizar vendas. O workshop de Design Thinkink aconteceu no dia 25/05/2019. A partir de junho a julho, a equipe já tinha realizado 11 vendas! Isso mostra o quanto a abordagem do Design Thinking foi importante para quebrar paradigmas e trabalhar a autoconfiança no momento do contato entre consultor imobiliário e cliente.
Conclusão
O Design Thinking trabalha na mudança de mindset, pois a abordagem constrói uma linha de raciocínio para os participantes atingirem o famoso momento eureka, ou seja, quando as ideias surgem na hora certa.
É uma abordagem de resolução de qualquer problema, e é válido mencionar que problema é tudo que precisa de uma solução. Através das etapas e ferramentas, é possível encontrar a solução e acompanhar os resultados.
Com o Design Thinking também é possível praticar o ciclo de melhoria contínua, quando se quer atingir novos patamares (valores inalcançáveis anteriormente).
Com essa abordagem, é possível encontrar desde soluções simples e com baixo custo, até as mais complexas. Para cocriar, melhorar resultados, reduzir custos e otimizar tempo, por exemplo, é só escolher o melhor modelo para a sua situação e seguir as etapas com as ferramentas escolhidas.
Referências:
LIMA, Talita S. Processo baseado no Design Thinking para identificar medidas para gerenciamento de software. Trabalho de Conclusão de Curso (MBA em Tecnologia de Software) – Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2020.
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