Em abril de 2024, meu time tinha acabado de fazer uma grande reformulação no nosso motor de crédito, acoplando novos modelos preditivos de machine learning e IA para uma escoragem interna. Em paralelo, estávamos terminando um processo de plataformização. Nós éramos “clientes” do time de Plataforma, e nosso produto estava sendo absorvido, em virtude da estratégia da empresa.
Durante esse momento, ao planejar o trimestre de 2024, me deparei com uma grande dificuldade: aprovar algumas iniciativas que eu havia discutido com os stakeholders. Elas não tinham um IRR tão atrativo quanto as de outras squads. Conversei com meu gestor sobre esse meu receio, e ele me tranquilizou: “Se não houverem oportunidades interessantes aqui, em outros times com certeza terão.” Ele me tranquilizou, mas eu não fiquei tranquilo.
Eu estava no auge da minha carreira, numa empresa que me dava espaço para discutir com lideranças executivas, montar materiais analíticos de altíssimo nível para justificar esforços em iniciativas. Além disso, estava contribuindo para a estratégia de plataformização e chegando no Break Even da companhia. Mas existiam alguns pequenos problemas como acontecem em qualquer empresa em que trabalhamos.
Dados do Ministério Público de 2020 mostram que pessoas de 18 a 24 anos são as que ficam menos de três meses no mesmo trabalho. Estava há um bom tempo, e por esses motivos combinados, acabei me colocando numa armadilha: um futuro desconhecido que talvez fosse melhor do que o que eu estava projetando.
Às vezes, o aceitável é preferível ao desconhecido, mesmo que não seja excepcional.
Entenda seu descontentamento
Recentemente, a AppleTV+ lançou uma série chamada “Matéria Escura”. A obra retrata o Gato de Schrödinger, uma teoria física que contribuiu muito para os avanços nos estudos de física quântica. De maneira bem resumida, essa teoria expressa a dualidade da realidade, como se houvesse duas verdades simultâneas até o momento em que você as descobre.
E com nossa vida profissional acontece do mesmo jeito. Quando você toma qualquer decisão, sempre existe o risco de não dar certo. Mas para compartilhar boas práticas de tomada de decisão, é importante entender os principais motivos que levam as pessoas a trocar de emprego.
Uma enquete feita pelo executivo Luciano Santos com mais de 1500 profissionais, concluiu os principais motivos de infelicidade no trabalho, do maior para o menor:
- O chefe
- Falta de oportunidade de crescimento
- Falta de reconhecimento
- Salários baixos
- Função desempenhada
A hora certa de encerrar um ciclo
Nesse mesmo contexto, ele apresenta um frame simples de perguntas que você deve se fazer para decidir se está na hora de mudar de emprego ou não:
- Há perspectiva de crescimento?
- Você está num ambiente acolhedor?
- Sente-se reconhecido pelo seu trabalho?
- Você tem um bom líder?
- Sente-se desafiado no dia a dia?
Se você responder “sim” para apenas 2 perguntas ou menos, está na hora de procurar algo melhor. No meu caso, quando tomei uma má decisão, havia respostas “sim” para mais de 3 perguntas desse frame. Fazendo um retrospecto, era muito mais uma questão de vaidade e emoção. Uma lição dura que aprendi depois disso foi: quando se trata da sua carreira, não é simplesmente um novo cargo. É algo que você vai fazer por várias horas do seu dia. É uma decisão muito importante para ser tomada sem tranquilidade.
Decisões na carreira também podem ser ruins
Para não dizer que tomei uma decisão completamente às cegas, havia alguns motivos racionais por trás dela. A área de produtos estava começando a aquecer novamente, e oportunidades surgiram. Eu tinha boas referências da empresa, além daquela vontade de trabalhar numa empresa de tecnologia conhecida.
Os benefícios financeiros eram bons, com bônus, ações, e o salário era um pouco maior. Como eu tinha acabado de comprar um apê, pensei: “pô, por que não?”
Meu pequeno descontentamento e minha pouca tranquilidade me levaram a trocar de emprego. E eu não poderia ter tomado uma decisão pior. Trabalhei num ambiente com pessoas tóxicas que davam “tapinha nas costas”. E quando eu virava, me apunhalavam, ou que simplesmente não queriam contribuir com o único objetivo de não deixar que trabalhássemos. O que me fez não enlouquecer de vez foi minha líder e meus pares de produto. Eles passaram pelos mesmos perrengues que eu e tínhamos um ambiente seguro para desabafar.
Consegui voltar para o lugar onde trabalhava apenas 4 meses depois de sair. Fica minha eterna gratidão por me abrirem novamente as portas. Os detalhes sobre esse retorno ficam para outro artigo.
Mas, em geral, isso comprova que fiz um bom trabalho, apesar de terem me convencido do contrário. Poucos dias atrás, quando fui informar minha líder sobre minha saída, ela me deu uma dica muito importante:
Lembre-se dos “motivos-chave” que te fizeram entrar na nova empresa
Ou seja, lembre-se dos “não’s” que foram respondidos no frame acima. Eles devem ser complementados com metas pessoais que precisam ser lembradas diariamente.
No exemplo da minha líder, ela queria se desenvolver em skills de liderança, além de trabalhar num produto de plataforma, o que a empresa proporciona a ela. Então, quando as dificuldades aparecerem, ela precisa ter sempre em mente o que a fez tomar essa decisão. Pautado nisso, ela também deve decidir se ali é, ou não, um lugar pra ela num futuro a curto/médio prazo.
Pouco antes de ser aceito de volta na minha antiga empresa, tive uma conversa esclarecedora sobre sair do meu atual emprego com um Product Manager que admiro. Ele me deu uma visão mais pragmática sobre o que deve ser considerado ao tomar a decisão de mudar de emprego.
Faça as perguntas certas
Quando você está trabalhando em algum lugar, pelo menos um dos critérios abaixo deve ser preenchido:
- Estou ganhando muito dinheiro na nova empresa;
- Estou aprendendo muito nesse novo contexto;
Essa abordagem tira muita complexidade da tomada de decisão e nos traz um viés objetivo. Sobretudo quando vem a necessidade de decidir sobre ficar ou sair de um emprego, ou aceitar ou recusar uma oferta de emprego.
Não tem como prever o futuro, mas tem como tomarmos melhores decisões se tivermos em mente que carreira é um assunto extremamente importante, pois se trata de algo que faremos como principal atividade.
Se estivermos felizes no trabalho, é muito mais provável que todo o restante da nossa vida siga em sinergia com esse sentimento. Existem algumas técnicas que podem nos ajudar nessa tomada de decisão. Entre elas, um frame de perguntas que devemos fazer sobre nosso emprego atual, sempre nos lembrarmos do que nos fez tomar a decisão. Além disso, sempre pensar se estamos aprendendo muito ou ganhando muito na nossa posição atual.