Sabemos que uma gestão baseada em outcomes é fundamental em uma cultura moderna de desenvolvimento de produtos digitais. Já até abordamos recentemente a diferença entre outcomes de negócio e produto neste artigo.
Essa perspectiva não se limita a área de Produto, já que todas devem buscar contribuir para o alcance dos resultados esperados do negócio (outcome de negócio). Isso quer dizer que se o objetivo da empresa for aumentar o market-share, Marketing, Produto, Pperações e as demais áreas devem ter isso em mente ao definir seus planejamentos.
Especificamente na área de Produto, temos isso de maneira mais concreta por meio do processo de Discovery orientado a outcomes. Isso quer dizer que todas as iniciativas do departamento devem buscar alcançar um determinado resultado (outcome de produto) que impactará diretamente o outcome de negócio.
Para melhor ilustra como isso acontece na prática na área de Produto, e principalmente como sua implementação pode originar um impacto direto para a empresa, vamos a um exemplo fictício!
Case fictício: Portal Meu Lar
Imagine que você acabou de ser contratado pela Portal Meu Lar, um marketplace de anúncios imobiliários que atua no Brasil. Apesar do time enxuto, a empresa já é bastante consolidada no interior do país e precisa ser ágil para não perder espaço para gigantes do mercado que estão expandindo para fora dos grandes centros.
Como um marketplace comum, o modelo de negócios é baseado em anúncios. Ou seja, o motor de receita são anúncios pagos; quanto maior a procura por imóveis, e mais qualificados forem os visitantes, maior o interesse das imobiliárias e proprietários de imóveis em anunciar.
Durante o processo de onboarding, além de serem apresentados a visão, missão e valores da empresa, você toma conhecimento do objetivo da empresa para esse ano—aumentar o faturamento em 30% em 12 meses
Como Product Manager, seu primeiro desafio será estruturar as iniciativas para o próximo semestre.
Você ainda não sabe muito sobre o comportamento dos usuários, mas sabe que independente de qual caminho seguir, ele deverá contribuir diretamente para o alcance da meta da empresa.
Definindo o outcome de produto
Após conversas iniciais com o time de Desenvolvimento, ler documentações existentes e se debruçar sobre as ferramentas de analytics, você começa a encontrar muitos pontos de atenção. Porém, dois em específico chamam a sua atenção:
- O número de visitantes do site está estagnado e não cresce mais que 5% YoY (year-over-year, ou, ano após ano), apesar do boom no mercado imobiliário nos principais mercados onde atuam;
- Apenas 10% dos visitantes entram em contato com algum anunciante.
Você não tem muita facilidade com dados, mas com alguma ajuda, faz análises mais detalhadas e, partindo dos dados históricos, você percebe que:
- Ao aumentar o número de visitas em 30%, o faturamento cresce 10%
- Ao dobrar a taxa de conversão de visitantes para contatos com anunciantes realizados, esse aumento pula para 25%.
Esse crescimento, por si só, pode contribuir com mais de 80% da meta do ano da empresa. O que te leva a crer que ter esses dois pontos como seus outcomes de produto para o ano pode ser o caminho ideal a seguir.
Delimitando a oportunidade de foco
Com o outcome de produto definido, você precisa afunilar mais para encontrar oportunidades a serem atacadas. Afinal de contas, como fazer as visitas aumentarem 30% e simplesmente dobrar a conversão para contatos? Isso é possível?
Lendo documentações de discoveries anteriores, você encontra muitos usuários citando problemas com a navegação pelos anúncios no mapa; em contrapartida à lista, a qual é a visualização padrão. Ao se aprofundar nesse tema e realizar algumas entrevistas com usuários, percebe-se que 70% deles classificam a navegação no mapa como “inferior” ou “muito inferior” quando comparada a outras plataformas similares.
Além disso, você teve acesso a uma pesquisa recente feita pelo time de UX que mostrou que 2 em cada 3 usuários tendem a preferir uma navegação via mapa para começarem suas pesquisas em vez do modo lista.
Tudo isso, leva você a acreditar que melhorar a navegação via mapa é uma oportunidade com bastante potencial. Afinal de contas, 2/3 da base utiliza-a para começar a fazer suas pesquisas e 70% de toda sua base considera-a bastante deficiente. Não só isso, esse é uma oportunidade que impacta tanto a aquisição quanto a conversão de visitantes, ou seja, pode mexer o ponteiro do seu outcome de produto.
Definindo qual solução desenvolver
O espaço de oportunidade a ser explorado, melhorar a navegação via mapa, está claro, mas como definir o que fazer?
Com mais uma ajudinha do time de análise de dados e de UX, você consegue ter acesso a algumas percepções interessantes:
- O número de usuários que entram em contato com anunciantes é 5 vezes maior para aqueles que utilizam a funcionalidade de favoritar anúncios;
- Quando clicamos nos anúncios no mapa, eles nos mostram apenas informações básicas — uma foto, preço, número de quartos e área total;
- Em entrevistas com usuários foi possível perceber que grande parte deles abrem os anúncios em novas guias para consultar seus detalhes depois.
Baseado nisso, você conclui que:
- Favoritar anúncios é uma alavanca importante para fazer usuários contactarem anunciantes;
- Pode existir espaço para otimizar o que é disposto sobre os anúncios diretamente no mapa;
- Usuários já tem o hábito de “selecionar para ver os detalhes” determinados anúncios, porém eles efetuam isso abrindo novas abas. Ao manter esse comportamento, arriscamos perder o usuário que pode nem sequer visitar mais essas novas guias.
Sendo assim, você conclui (com algum grau de incerteza, mas baseado em argumentos concretos), que possibilitar ao usuário favoritar anúncios diretamente no mapa aparenta ser uma boa solução inicial para começarmos a evoluir essa navegação.
Conclusão
No exemplo do Portal Meu Lar, percebemos que passamos por 3 fases distintas para sairmos do outcome de negócio até a solução que será desenvolvida.
- Primeiramente definimos o outcome de produto;
- Em seguida, mapeamos oportunidades dentro desse espaço;
- Exploramos um universo de soluções e escolhemos uma para ser desenvolvida.
Todo esse fluxo é nada mais do que uma gestão orientada a outcomes.
Estamos focando em resolver uma dor do usuário, mas não é qualquer dor. É uma dor que ao gerarmos valor para usuários, estamos também gerando valor para o negócio. Afinal de contas, empresas existem para gerar valor para elas mesmas ao resolver um problema dos seus clientes.
No nosso exemplo, foi só a partir da definição de aquisição e engajamento como prioridade, seguida de toda a análise, que pudemos perceber que atuar na navegação via mapa poderá de fato “mover ponteiro”, ou seja, impactar o business outcome.
O exemplo do Portal Meu Lar é uma ilustração simplificada da realidade. Na maior parte das vezes você encontrará desafios como:
- Dificuldade em acessar dados históricos, já que, muitas vezes, esses dados estão dispersos em diferentes sistemas e fontes;
- Inexistência de dados; seja porque nunca foi uma prioridade ou porque o set-up de um evento específico não foi feito corretamente;
- Dificuldade para conectar os dados e gerar insights. Podem existem tantas dados que você precisará quebrar um pouco a cabeça conectando-os os pontos; a geração de insights não é linear.
- Não encontrar uma métrica que conecte diretamente com o outcome de produto ou de negócio e ter que usar uma proxy metric.
- Entre outros.
Por fim, convido você a olhar agora para o que seu time está desenvolvendo e se questionar: isso “move ponteiro” de negócio? Como as iniciativas que desenvolvemos em produto se conectam com os objetivos da empresa?
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