Aqui no Brasil estamos muito acostumados a ouvir o termo “marketplaces” e associar com negócios de e-commerce, mas marketplaces podem ser negócios de praticamente qualquer segmento que você tenha uma relação de vários ofertantes e vários demandantes (many-to-many).
Todos nós provavelmente já participamos de algum marketplace em algum momento, eles são muito comuns. Naturalmente, eles são negócios complexos e difíceis de construir, mas são ainda mais difíceis de serem derrubados. Eles podem ser extremamente duráveis e rentáveis quando atingem um bom nível de liquidez.
Alguns exemplos famosos são: AliExpress, Airbnb, Uber, GetNinjas, Quinto Andar e Singu.
Modelos de negócio para Marketplaces
Existem basicamente 3 modelos de negócio amplamente usados por marketplaces como fonte de receita. Que inclusive podem ser utilizados em conjunto, não são excludentes.
Criei uma planilha com alguns exemplos e um espaço para você ir preenchendo como é o marketplace que você está avaliando enquanto vai entendendo os conceitos desse artigo, acesse aqui.
1. Anúncios e “listagem patrocinada”
Um bom exemplo de empresa que utiliza bastante esse tipo de geração de receita é a OLX, ela conecta compradores e vendedores de produtos usados. Se você quiser, pode pagar para destacar algum item que esteja vendendo, aumentando suas chances de vendê-lo.
Outro gerador de receita são os anúncios de mídia programática que aparecem na plataforma, assim eles se beneficiam também do alto volume de tráfego, vendendo o espaço e audiência deles para plataformas de compra de mídia.
2. Modelo de comissão
O modelo de comissão é quando a plataforma ajuda a intermediar a relação do ofertante e demandante, tirando um valor de comissão pelo serviço. É como a Uber, Airbnb e tantas outras empresas fazem.
Quando você utiliza a Uber, o motorista fica com 75% da corrida e a Uber com 25% (podendo variar de país para país), por exemplo.
3. Modelo de assinatura
Com esse modelo, a plataforma cobra pagamentos recorrentes de um dos dois lados. No caso do Spotify, por exemplo, ele cobra uma assinatura dos usuários para fornecer o serviço de streaming de músicas.
Esse modelo tem uma vantagem muito interessante quando se olha do ponto de vista de recorrência e previsibilidade de receita.
Tipos de Marketplaces
Bom, agora já sabemos como um marketplace pode fazer dinheiro, vamos olhar mais da perspectiva de produto algumas vertentes de marketplaces que existem. Nem todos funcionam da mesma forma, alguns centralizam a responsabilidade mais do que outros.
Enquanto na OLX, boa parte da transação depende da interação dos usuários e de como eles combinam a venda. Já no Mercado Livre a venda ocorre quando a compra é realizada pelo site, como em um e-commerce, e, nesse momento, o Mercado Livre se responsabiliza por acertar com o vendedor o envio. Veja os 3 tipos:
Comprometimento Mútuo (Double-commit marketplaces)
Responsabilidade: Descentralizada
Exemplo: Upwork, Tinder, OLX
São marketplaces onde tanto o comprador quanto o vendedor interagem para gerar uma transação (ou um match ?). Esse modelo tende a ter baixa liquidez, porque exige esforço e tempo de ambos os lados para buscar, conversar e negociar, resultando em baixas taxas de conversão.
Escolha do comprador (Buyer-picks)
Responsabilidade: Híbrida
Exemplo: Airbnb
São marketplaces onde há, normalmente, uma oferta maior que a demanda. Neste modelo, os compradores que se comprometem com a transação.
Muitos negócios mudam de um modelo de comprometimento mútuo para um modelo de escolha do comprador. Isso porque ajuda a diminuir bastante a fricção por reduzir a interação com o lado da oferta, o comprador escolhe e realiza a transação. O Airbnb foi um negócio que fez essa transição.
Um case diferente de negócio que também fez essa transição, mas de maneira diferente foi o GetNinjas. Eles passaram de um modelo de plataforma onde o comprador buscava em uma lista de prestadores de serviço alguém que pudesse resolver seu problema para um modelo onde o usuário diz qual problema ele quer resolver e a plataforma vende esse lead para os prestadores de serviços.
Escolha do Marketplace (Marketplace-picks)
Responsabilidade: Centralizada
Exemplo: Uber
É quando o próprio marketplace faz o encontro entre a oferta e a demanda (quem quer vender e quem quer comprar).
Dos 3 modelos, é o que oferece a menor fricção. Naturalmente, ele exige um padrão tanto na demanda quanto na oferta, tanto nas características do serviço, quanto na qualidade.
Para esse tipo de marketplace, é crucial que haja um acompanhamento muito minucioso de métricas de satisfação e qualidade. É muito comum as pessoas associarem a responsabilidade à plataforma, já que nesse caso foi ela quem fez a escolha.
Embora tenham melhor liquidez, geralmente têm efeitos de rede mais fracos. Uma vez que o fornecimento é padronizado, existem menores barreiras de entrada e mais competição.
Por exemplo, no mercado de aplicativos de transporte é comum os motoristas trabalharem tanto para a 99 quanto para a Uber, assim como é fácil para os usuários trocarem de aplicativo também.
Métricas de Marketplace
Muitos de nós já ouvimos falar de KPIs importantes para medir negócios digitais:
Mas quando falamos de marketplaces, as métricas de sucesso são mais complexas. A maioria desses negócios depende de oferta e demanda, é preciso olhar os dois lados para fazer uma boa avaliação.
Por isso, esse artigo vai passar por 3 grandes etapas chave e suas respectivas métricas:
- Tamanho
- Forma
- Liquidez
1. Quanto vale o seu marketplace?
Em marketplaces é muito comum a utilização do GMV (Gross Merchandise Value) como North Star Metric, que é, em outras palavras, a métrica que melhor captura o principal valor que o produto oferece.
O GMV mede o valor total das vendas, simples assim.
GMV = Preço de venda (ticket médio) x Unidades Vendidas
Para muitos negócios, especialmente de e-commerces, o GMV representa toda a cadeia de valor.
Por exemplo, no Mercado Livre, quanto maior o GMV deles, maior vai ser a quantidade de itens vendidos e/ou de seus valores. Para chegar nisso, podem ser utilizadas diversas alavancas de crescimento.
Agora que você tem o total de faturamento gerado, quanto desse valor fica para o seu negócio? É isso que o take rate explica. Se o seu GMV é de 1 milhão e o seu negócio fica com 100 mil, o seu take rate é de 10%. Veja alguns benchmarks:
2. Quão concentrado é o seu marketplace?
Existem duas maneiras interessantes de entender o mercado onde seu marketplace está inserido. Uma delas é simplesmente entender qual a % do GMV são dos meus maiores demandantes e ofertantes.
Em alguns mercados, esse número é extremamente concentrado em alguma ponta, como nas empresas de streaming de música. Apenas três gravadoras: Warner Music Group, Universal Music Group e Sony Music, são responsáveis por 65% de toda a receita da indústria.
As empresas de streaming, como o Spotify, teriam grandes problemas se não conseguissem esses fornecedores.
Outro exemplo de um cenário diferente é o mercado de venda de produtos usados. Cerca de 85% dos brasileiros com internet têm algum produto parado em casa e poderia ser vendido e 72% têm intenção de vender. Esse comportamento é o que impulsiona fortemente o lado da oferta na OLX, que hoje conta com uma grande base compradores e vendedores.
Note que é muito provável que parte dos compradores também sejam vendedores em algum momento. Outra métrica interessante de analisar nesse cenário é a relação de compradores/vendedores que sejam os mesmos usuários. Uma alta taxa dessa métrica indica que seu custo de aquisição (CAC) é reduzido, porque você adquire ambos de uma única vez. Essa métrica é conhecida como “Buyer/Seller Overlap“.
Um fornecedor atende quantos clientes?
Outra forma de avaliar a concentração do mercado é olhar para a relação de “Fornecedor para cliente” ou provider-to-customer ratio (também chamada de Buyer to Supplier Ratio). Dessa forma você consegue entender melhor a dinâmica do marketplace. O Airbnb chega a ter uma relação de 1:70, o uber de 1:50 e o eBay de 1:5. (fonte)
TRANSAÇÕES POR CLIENTES / TRANSAÇÕES POR OFERTANTE
Quanto mais clientes um fornecedor consegue atender, mais você deve se concentrar no fornecedor no início. Pois, naturalmente, o fornecedor vai participar de muito mais transações que um cliente.
Outro ponto importante é pensar sobre o comportamento ocioso dos seus usuários. Se um motorista da Uber, por exemplo, não conseguir clientes, ele pode utilizar outro aplicativo em paralelo. Porém um cliente ocioso, pode começar a usar outro aplicativo e se fidelizar. É necessário pensar bem a lógica por trás do seu negócio nesse início.
Quanto mais o seu negócio tiver uma relação próxima de 1:1, você terá o desafio de crescer nas duas bases quase que na mesma velocidade.
“Quando comecei a observar a evolução de como mercados como o nosso crescem, o manual é o mesmo: Conseguir restaurantes -> Conseguir entregadores -> Conseguir clientes. A maior alavanca de crescimento sempre foi a oferta – os restaurantes. Eles trazem a demanda. ”
— Micah Moreau, VP de Growth da DoorDash
3. Qual o percentual das buscas resultam em conversões?
Essa métrica é bem simples, representa toda vez que seu usuário demonstra uma intenção de compra ou de usar o serviço. Por exemplo, ao utilizar o campo de busca, ele claramente está indicando o que está procurando.
Esse ponto é ótimo quando olhamos da perspectiva de produto, porque esse pode ser uma excelente métrica para avaliar alguma melhoria que você fez nessa etapa da jornada do usuário.
Ela é uma excelente métrica também para encontrarmos oportunidades. Se ela estiver baixa, pode ser um sinal de que há um problema com a oferta na plataforma. É interessante analisá-la também por região ou segmentos de usuários, assim você pode entender melhor como cada local ou segmento está encontrando a oferta.
Para realizar o cálculo desta métrica, você precisa pegar o número total de conversões que vieram através das buscas e dividir pelo total de buscas.
Fórmula: Search to Fill = Conversões de buscas / Total de buscas
Casos de uso:
- Amazon, Airbnb, Mercado Livre, Udemy: % de buscas que resultaram em transações
- Uber, 99: % de chamadas que resultaram em corridas
- GetNinjas: % de solicitações que resultaram em serviços
- Youtube: % de buscas que resultaram em vídeos assistidos
Quanto tempo leva para que a oferta encontre a demanda?
Essa métrica é usada para negócios que levam algum tempo para suprir a oferta, funciona apenas para ofertas que sejam limitadas. É muito útil para entender a eficiência do seu negócio.
Para melhorar esse quesito, ao abrir o aplicativo do uber, ele já prevê sua chance de chamar um veículo e já ‘reserva’ um motorista próximo. Assim, quando você chamar, o tempo de espera vai ser muito menor.
Esse indicador é simples de ser acompanhado, você só precisa pegar o período de tempo necessário para ter uma oferta atendida, seja em minutos, horas, dias e etc.
Casos de uso:
- Quando alguém faz um pedido no Ifood, quanto tempo em média leva para que o pedido chegue ao usuário?
- Ao chamar um carro na Uber, quanto tempo leva para encontrar um motorista?
- Para um hotel no Booking.com, quantas noites um quarto fica vazio antes de ser reservado?
O quanto conseguimos preencher de oferta e demanda?
O principal objetivo de um marketplace é o encontro da oferta e demanda. O Match Rate é a métrica que tenta medir o quanto seu negócio está conseguindo fazer isso.
Ela não possui uma regra simples, acaba dependendo de como cada negócio funciona. No geral ela diz que dado uma nova oferta, qual será a probabilidade de preenchimento dela.
Match rate = OFERTAS PREENCHIDAS / OFERTAS DISPONÍVEIS
Veja que os casos de uso podem ser bem diferentes:
- Uber, 99: Qual % do tempo os motoristas estão dirigindo com passageiros VS vazios?
- Airbnb: Quantas noites dos imóveis listados estão ocupadas VS vazias?
- OLX: Quantos dos produtos oferecidos, quantos conseguiram fechar a venda?
Conclusão
Você deve ter percebido que marketplaces são negócios de natureza complexa. São negócios muito difíceis de serem criados e, uma vez que estão ‘dando certo’, são difíceis de serem parados. É muito difícil definir um playbook que sirva a todos os negócios, naturalmente cada um vai ter sua própria especificidade.
Espero ter passado uma visão mais abrangente e recheada de exemplos de como esses negócios funcionam e algumas ferramentas de como você pode utilizar hoje para entender melhor a dinâmica de um marketplace. Saber como ele opera é fundamental para encontrar as melhores alavancas de valor e entender porque uma estratégia pode dar muito certo ou muito errado.Veja quais métricas abordadas nesse artigo podem te ajudar, e se analise-as mais profundamente também para segmentos de clientes e regiões diferentes, isso pode te dar uma boa noção de como agir em determinado local. Negócios como o Airbnb e Amazon utilizam muito o search to fill para entender comportamentos e até mesmo prevê-los. Esse entendimento é chave para te tornar um Product Manager acima da média.
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